segunda-feira, 27 de maio de 2019

Teatro Espontâneo

“A agulha do Real nas mãos da fantasia”
                                                   A linha e o linho, Gilberto Gil
Como já foi dito, o Psicodrama que fazemos hoje não é o Psicodrama que Moreno fazia. Assim também podemos falar do que convencionamos chamar Teatro Espontâneo. Moreno denominava, e assim intitulou seu livro, Teatro da Espontaneidade. Nós usamos a expressão Teatro Espontâneo. Trata-se da mesma coisa? Estamos falando de mera troca de uma locução adjetiva, da espontaneidade, pelo adjetivo correspondente, espontâneo? Não, penso que não. E é disto que tratarei a seguir.
Como as palavras são envoltórios dos conceitos, o que propomos aqui é a discussão dos conceitos embutidos nas duas situações. Lendo o livro de Moreno, percebemos que sua intenção primeira era de valorizar e sedimentar o conceito de Espontaneidade. Era o centro de sua atenção, de seu universo particular. Era a sua ferramenta para se contrapor ao conservado, petrificado, tradicional. Ao teatro morto e congelado se contrapunha a experiência espontânea. Era a sua lança diante do moinho de vento do teatro tradicional. Assim DA ESPONTANEIDADE refere-se a um substantivo, a um algo que precisa ser exibido, desenvolvido, cultivado. Todo o esforço da trupe e de Moreno era exibir diante de uma plateia descrente e atônita, um algo novo, revolucionário: a Espontaneidade. Fazendo uma dublagem (duplo) de um possível frequentador, digo: ”Puxa, não é que existe mesmo esta Espontaneidade que Moreno fala? Eu a vi no palco”. Também posso fazer outra dublagem (duplo): “por mais que eles se esforçassem não vi a Espontaneidade apregoada, vi uma bagunça completa". Como poderia ser a dublagem de um ator qualquer da trupe: “Hoje a Espontaneidade estava no palco, vi no rosto das pessoas sua surpresa". Ou então: “Tentamos de tudo, mas não deu". E Moreno, qual seria seu duplo? “Eu sabia que era possível mostrar do que a Espontaneidade é capaz!”. Ou: “Vou ter que inventar mais um jeito para esfregar na cara das pessoas que isto existe!”. Como toda dublagem, ela poderia ou não ser validada pelas pessoas, mas, para efeito de discussão consideremos que houve esta validação. A Espontaneidade era a atriz principal de seu Teatro. Todos os olhos voltados, benévola ou malevolamente, para ela. O Teatro da Espontaneidade existia e existiu, para justificar uma ideia de Moreno. Foi necessário, foi imprescindível. No contexto da época, estimular a existência da Espontaneidade era navegar contra uma corrente que via a liberdade e espontaneidade como geradoras de caos, de caos destrutivo. A década de 20 do século XX ainda era século XIX: sua estética, sua ética, sua moral era de um século XIX estendido. Moreno e Freud, trouxeram, a seu tempo, dois demônios a serem exorcizados, o sexo e a espontaneidade.

Mas, tempus fugit. O tempo passa. Ao longo do tempo, o substantivo Espontaneidade foi sendo substituída por um adjetivo, uma qualificação. Gradualmente, já não se perseguia a espontaneidade como um fim e sim um agir espontâneo, um criar espontâneo, um viver espontâneo. Uma CREAÇÃO. Em que o objetivo está no processo, no status nascendi. O Teatro Espontâneo é a criação em status nascendi. Seu objetivo, sua meta, sua realização é o próprio fazer, o construir. “mais importante do que a evolução da criação é a evolução do criador”. O ritmo, a estética são balizadores do fazer harmônico daquele grupo. No Teatro Espontâneo matricial, em que do próprio grupo emergem as histórias, o protagonista, os egos auxiliares, cada grupo ou cada agrupamento tornado grupo pelo aquecimento, tem caminhos diferentes, constrói-se diferente e tem o seu fim possível. Cada grupo obtém o que ele pode obter daquele e naquele MOMENTO (Kairós). A dublagem (duplo) possível de um membro do grupo: “Gostei de sentir que podemos fazer coisas juntos, a partir do nada”. Ou então: “Achei uma história boba, parecendo grupo amador”. O condutor do grupo: “Tinha instantes que não sabia o que fazer ou por onde ir, mas sempre confio no grupo e aonde ele me leva”. Embora trabalhoso, arriscado, demandando uma direção cuidadosa, o TE no formato matricial, sem trupe específica, possibilita ao grupo não só contar e ouvir histórias, mas, e principalmente, fazendo-se de ator e dramaturgo, construir um algo evanescente, produção possível do grupo, fotografia daquele instante vivencial, atravessado pelo social e pelo histórico, que dura o que o grupo durar, mas permanece como experiência indelével. A meta é o caminho.

sábado, 18 de maio de 2019

18 de maio de 1974

Há 45 anos morria. Moreno. Jacob Levy Moreno.Criador do método Socionômico, do Psicodrama, do Sociodrama, Teatro Espontâneo.Mas não é sua morte que deve ser lembrada, apenas. Mas os fundamentos filosóficos que sustentam seu método Socionômico. O ser humano é um ser em relação. A Criatividade-Espontaneidade são as raízes do desenvolvimento humano. Ver o mundo com o olhar do outro ao tempo que o outro vê o mundo com o nosso olhar. A chance de outro começo, outro olhar, a segunda vez pode libertar a primeira vez que ficou cristalizada no tempo, confiança no grupo, confiança.
"Aqui jaz aquele que trouxe alegria à psiquiatria." Este é o seu epitáfio.
E este é o seu eterno convite:
CONVITE AO ENCONTRO  
Mais importante do que a ciência é o seu resultado,
Uma resposta provoca uma centena de perguntas.
Mais importante do que a poesia é o seu resultado,
Um poema invoca uma centena de atos heróicos.
Mais importante do que o reconhecimento é o seu resultado,
O resultado é dor e culpa.
Mais importante do que a procriação é a criança,
Mais importante do que a evolução da criança é a evolução do criador.
Em lugar de passos imperativos, o imperador.
Em lugar de passos criativos, o criador.
Um encontro de dois: olhos nos olhos, face a face.
E quando estiveres perto, arrancar-te-ei os olhos e colocá-los-ei no lugar dos meus,
E arrancarei meus olhos para colocá-los no lugar dos teus olhos;
Então te verei com os teus olhos
E tu me verás com os meus olhos.
Assim, até a coisa comum serve o silêncio
E nosso encontro permanece a meta sem cadeias;
O lugar indeterminado, num tempo indeterminado,
A palavra indeterminada para o Homem indeterminado.
(Jacob L. Moreno)  

domingo, 12 de maio de 2019

Dia do Papel de Mãe

Hoje é Dia das Mães. Ou o Dia do Papel de Mãe. Pensando em termos psicodramáticos (socionômicos) o papel de mãe surge da relação com pessoas em que há os atributos de continência, aceitação, limite, disciplina, incondicionalidade do afeto e, sobretudo, magia de fazer da imaginação uma ferramenta de cura e resolução de problemas. É uma relação assimétrica entre os papéis - o de filho e o de mãe. Acolhimento de um lado do papel e necessidade no outro lado dessa relação. Mas nesse papel materno cabem atores mães biológicas, mulheres, homens, amigos, amantes, profissionais  de qualquer área. A  função de acolhimento versus necessidade é a fundadora do papel de psicoterapeuta, por exemplo. Pais podem e devem ser mães. E é função do papel materno. Hoje é dia do papel materno, dia da mãe que cada um pode ser na sua relação com o outro.

sábado, 11 de maio de 2019

Para que um título?

Fui convidado para uma atividade aberta na ABPS de São Paulo. E aí me foi pedido um título para o trabalho. E aí mais uma vez me deparo com algo que me deixa pensativo. Para que serve um título para um trabalho qualquer? Serve, penso, para que quem o leia já inicie seu aquecimento para a atividade, muitas coisas começam a passar pelo leitor. Favoráveis ou não. Mas todas servem para um aquecimento ainda no tempo da leitura do título. Assim, desse ponto de vista, um título é o início de um aquecimento. Bem feito ou mal feito. Então o título deve conter elementos instigadores ou inusitados ou surpreendentes ou estranhos. O que for. Mas sempre não banais nem repetitivos. Então, o título para a plateia, para o leitor, para o curioso, é sempre um aquecimento ou desaquecimento. Mas, há outro angulo que me deixa pensativo. O título para o condutor de Psicodrama/Teatro Espontâneo pode ser um enorme limitador da criatividade. Obrigar-se (eu escrevi obrigar-se!) a seguir um título planejado que corresponde a uma expectativa, a um plano, pode desconsiderar gravemente o movimento grupal, aquilo que se inicia e se desenvolve quando o grupo está se construindo. Quando uma atividade psicodramática se inicia algo novo se constrói.
"Todo começo é involuntário". Fernando Pessoa

quarta-feira, 1 de maio de 2019

E se....

E se... . Eu não devia. Eu devia. Não, eu quero. 
Eita expressões problemáticas! Cada uma delas,  se for perguntado ao protagonista que as expressa, qual o cenário, a paisagem mental, a imagem, a cena correspondente veremos quantos universos simultâneos acontecem em nós. E traduzindo em cenas efetivas, atualizando no palco essas paisagens mentais, trazendo ao concreto da cena o que está subjetivado, teremos a realização do Psicodrama, do Teatro Espontâneo.

Postagem em destaque

E assim é.

Experimentar e refletir.  Este blog é um espaço para mostrar ideias sobre o psicodrama, sobre o teatro espontâneo.  Há mais de trinta anos...