Li há algum tempo, uma crônica de Umberto Eco em que ele fazia uma inteligente observação sobre o ato de reconhecimento. Reconhecer e ser reconhecido, dizia ele, era, até bem pouco tempo, algo referente a uma atitude, uma ação, um gesto feito por alguém que o notabilizava diante dos outros. Um descobrimento, uma invenção, uma posição política. E aí ele faz sua pequena e aguda observação. Ser reconhecido, hoje em dia, é literalmente ter seu rosto reconhecido, ter sua fisionomia reconhecida, pela recordação de alguma mídia em que haja saído sua imagem. Não mais se trata de reconhecer algum nível de grandeza humana no outro. Mas, sim, simplesmente, reconhecer um rosto já mostrado. É a própria sociedade do espetáculo em ação. Um rosto na mídia vale mais que um feito, uma realização importante. A imagem suplanta o conteúdo.
segunda-feira, 24 de junho de 2019
sábado, 15 de junho de 2019
Soneto e Psicodrama
Soneto
Chico Buarque
Por que me descobriste no abandono
Com que tortura me arrancaste um beijo
Por que me incendiaste de desejo
Quando eu estava bem, morta de sono
Com que mentira abriste meu segredo
De que romance antigo me roubaste
Com que raio de luz me iluminaste
Quando eu estava bem, morta de medo
Por que não me deixaste adormecida
E me indicaste o mar, com que navio
E me deixaste só, com que saída
Por que desceste ao meu porão sombrio
Com que direito me ensinaste a vida
Quando eu estava bem, morta de frio
Chico Buarque
Por que me descobriste no abandono
Com que tortura me arrancaste um beijo
Por que me incendiaste de desejo
Quando eu estava bem, morta de sono
Com que mentira abriste meu segredo
De que romance antigo me roubaste
Com que raio de luz me iluminaste
Quando eu estava bem, morta de medo
Por que não me deixaste adormecida
E me indicaste o mar, com que navio
E me deixaste só, com que saída
Por que desceste ao meu porão sombrio
Com que direito me ensinaste a vida
Quando eu estava bem, morta de frio
Chico é sempre Chico. Mas, ao lado de ser um Poeta, há o que pode ser lido nas entrelinhas de seu poema/letra. Em Psicodrama/TeatroEspontâneo, a ideia central é permitir ao protagonista um novo olhar. Isso porque o olhar cristalizado, o olhar conservado, o olhar petrificado, para nós, Psicodramistas, é o núcleo dos problemas existenciais. Mas, psicoterapia não é salvação a todo custo. "Vou lhe salvar quer queira ou não". O poema/letra de Chico mostra que o risco e o medo de mudar, muitas e muitas vezes,impede a própria mudança. Nesse caso, o Psicodrama/Teatro Espontâneo permite que a mudança de vida ou de atitude seja realmente experimentada na realidade suplementar do palco psicodramático. E sem desafiar o medo/temor do protagonista. Mas dando a ele a segurança e a continência do como se Psicodramático.
terça-feira, 11 de junho de 2019
Dia dos Namorados/Enamorados
Para nós Psicodramistas as relações se estabelecem entre papéis. Ou seja, não existe um eu sozinho, o eu é sempre relacional. E, em cada relação mediada por papéis há sempre instantes de tomada (aprendizado) do papel, desenvolvimento desse papel e criação sobre ele. Isto continuamente num loop existencial. Cada papel constitui seu papel complementar. E essa relação pode se construir de forma simétrica ou assimétrica. O nosso grande mestre Dalmiro Bustos, num grande saque, diz que papeis assimétricos são nomeados diferentemente e papeis simétricos são nomeados com uma mesma palavra, no plural. Assim, professor/aluno, marido /mulher, pais/filhos, terapeuta/paciente são vínculos assimétricos. Amigos, namorados, inimigos, irmãos são vínculos simétricos. Então, em vínculos simétricos os dois papeis se complementam de forma paritária. assim namorados é um vínculo simétrico caracterizado pelo enamoramento. Essa condição de enamorado/enamorada é o que dá a esse vínculo a nomeação de namorados. Portanto, no dia dos namorados estaremos celebrando a condição de enamoramento, estar enamorado, estar em amor.
sábado, 1 de junho de 2019
Arte e/ou técnica
Desde
cedo quando descobri que, em Grego, a palavra techné é arte, fica
flutuando pelo meu espírito uma dúvida que nunca soube muito bem
qual era. Sentia que havia algo, mas não estava claro o que. Passei
a pensar e refletir.
Os
gregos chamavam de techné àquilo feito com habilidade e destreza.
Heródoto definia como: saber fazer de forma eficaz. Ars,
já para os latinos, conserva a mesma acepção, com outra palavra.
Na Idade Média, Ars Mechanica começou a corresponder ao que hoje
chamamos de técnica. E aí começa uma divisão entre o técnico e o
artístico. Ao primeiro termo é dada uma conotação de precisão e
seriedade que parece faltar, no senso comum, ao artístico. Ser
técnico é ser preciso, exato, científico. Sério, portanto. Ser
artístico é ser sonhador, pouco racional, impreciso. Não sério.
Um filho técnico faz o pai confiar no seu futuro. Um filho artista é
uma preocupação constante. Entretanto, ao vermos ou lermos a
descrição de um matemático da demonstração de um teorema,
percebemos que há um sentido estético na apreciação. Uma
bailarina é precisa, hábil. Há destreza em seu passo. Os longos
anos de preparação de uma bailarina, suas dores, falam de técnica,
precisão, exatidão. O exercício é Técnica. E Arte. E como Arte
inclui a estética. O gesto preciso e econômico. Como o Artesão. O
Artista sabe. E sabe fazer de forma eficaz. O Artista é exato. Chico
Buarque diz da saudade: é o revés do parto. Econômico, preciso.
Tal como E=mc2. Esta fórmula é bela. Chico é exato. Sempre o
bem-feito traduz-se em sensação estética. Podemos estar em sala de
psicoterapia, numa prancheta, em um papel escrito, um campo de
futebol, uma tela, um barro ou mármore. Tanto a nossa Arte quanto a
nossa Técnica confluem-se no bem-feito. Não nos esqueçamos que
Poesia, também em Grego, provém do verbo Poesis com significado de
fazer, fabricar. Arte ou Técnica? Arte/Técnica: exatidão e
estética, rigor e espontaneidade, precisão e leveza.
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