quarta-feira, 26 de fevereiro de 2020

Parasita

Assisti ao filme Parasita. Afora qualquer discussão ou consideração sobre a  estética cinematográfica, veio-me uma distinção nem sempre fácil de fazer ou entender. Sabedoria (wisdom), conhecimento (knowledgment), esperteza (slyness). O filme trata de esperteza (slyness). A sabedoria é o conhecimento englobado pela ética. Conhecimento é um instrumento de ação na Natureza. E esperteza? Esperteza tem a ver com a sobrevivência, com o imediato, com o presente. A esperteza não inclui o futuro. É "cada dia com sua pena". O horizonte da esperteza é curto. A sabedoria vê longe. E o conhecimento é o instrumento, o óculo para se ver. Isto é a minha visão de um segmento do filme. E o Psicodrama? Que tem a ver com isso? O que pode ter a ver com isso? Sempre podemos aprender com um campos da experiência e, a partir dele, olhar para outro campo experiencial. Dirigir uma ato psicodramático, um TE, exige conhecimento, profundo conhecimento do método socionômico. Mas, para o exercício da condução grupal, é fundamental a presença da esperteza, da sagacidade cênica, do pulo-do-gato. Entretanto, essas duas condições precisam ser complementadas pela sabedoria socionômica, a visão socionômico do viver. Sem essa sabedoria, ficaremos limitados ao desempenho técnico e a manha do dirigir. Psicodrama, TE, Sociodrama, atos socionômicos, enfim, precisam dos três.


segunda-feira, 24 de fevereiro de 2020

Feijoada completa

Mulher
Você vai gostar
Tô levando uns amigos pra conversar
Eles vão com uma fome que nem me contem
Eles vão com uma sede de anteontem
Salta cerveja estupidamente gelada prum batalhão
E vamos botar água no feijão
Mulher
Não vá se afobar
Não tem que pôr a mesa, nem dá lugar
Ponha os pratos no chão, e o chão tá posto
                       Feijoada completa, Chico Buarque
Ouvindo, agora, essa música de Chico, reparei nesse verso. É a marca do Teatro Espontâneo no exercício de condução no Psicodrama/Sociodrama. Não há o que se afobar, não precisa por a mesa, não há necessidade de preparar lugar. Eles chegam com sede e fome de ontem e anteontem. É o nosso aquecimento. Tendo isso, então, põe-se os pratos no chão, apenas. Fome e sede. O chão, o chão do palco, o palco, está posto. Aquecimento e espontaneidade. Eis o Psicodrama.

sábado, 22 de fevereiro de 2020

Estilo de condução

"Estilo é a feição peculiar das coisas. Um modo de ser inconfundível. A fisionomia. A cara." Essa frase de Monteiro Lobato, mais uma, ficou-me na cabeça. Passemos essa ideia, esse conceito, para o exercício socionômico, para o Psicodrama, para o Teatro Espontâneo. Cada direção psicodramática, cada Diretor de Psicodrama ou TE tem seu estilo, seu modo de ser inconfundível. Há diferenças de ritmo, estética que tornam reconhecível aquele estilo. Esse é o lado artístico desse fazer. É irrepetível e tem estilo. Sempre que possível, em encontros, jornadas, congressos, é bom participar de direções não conhecidas, expor-se a conduções diferentes. Para descobrir o seu próprio estilo de conduzir.

quarta-feira, 19 de fevereiro de 2020

O ficar e a Tele

E que tal pensarmos um pouco sobre o "ficar"? Claro que pessoas da minha geração têm alguma dificuldade de entender (e aceitar) o ficar. Vamos passar o olho psicodramático (socionômico) sobre o assunto. O que caracteriza o "ficar"? É um encontro mediado tão somente pela atração visual. Mas sem expectativa de continuidade. Este é o fator principal como característica desse encontro. Há um contrato implícito em que o presente é o que conta, sem futuro esperado. Mas, e se,  e se no dia seguinte algumas das duas pessoas acorda esperando uma mensagem? Quando numa relação entre dois papéis os dois concordam com o script do encontro, há uma relação télica. Quando há uma dissonância de expectativas, de projetos, de scripts, haverá uma relação não-télica. O ficar seria uma relação télica, o namoro seria uma relação télica, o esperar a mensagem que não chegará nunca, será uma relação não-télica.

domingo, 16 de fevereiro de 2020

Throw away the script

Em recente vídeo gravado  por Sergio Guimarães numa entrevista com Marcia Karpp (Psicodramista inglesa formada por Moreno) surge essa frase: "Moreno told us "throw away the script". Isto é a peça fundamental do edifício psicodramático. Esse edifício começou a ser construído exata,mente jogando fora os roteiros. Era o Teatro da Espontaneidade.  E jogar fora o roteiro não significa porraloquice.  E isto norteado pelo método psicodramático. Seguir um roteiro é ter algo pre-estabelecido, é ser não-espontâneo, é não fazer Psicodrama. Jogar fora o roteiro significa deixar o momento, a ocasião, a espontaneidade conduzir a direção da cena. Jogar fora o roteiro é fazer Psicodrama/Teatro Espontâneo.

terça-feira, 11 de fevereiro de 2020

O que é preciso?

O Teatro Espontâneo se sustenta no aquecimento, no ritmo e na estética. Como quem participa não tem o compromisso de fidelidade de um grupo terapêutico, ele só permanece  e participa se estiver aquecido para aquilo. É muito fácil deixar, sair, abandonar uma sessão de TE. O olho atento do Condutor/Diretor ao ritmo das cenas e na consonância da plateia mantém o aquecimento desejado. A mirada estética produz a sensação de bem feito reforçando, mais uma vez, o aquecimento. E isto é o grande presente dado ao Psicodrama e Sociodrama: ritmo e estética.

quarta-feira, 5 de fevereiro de 2020

Clarice Lispector

Uma pessoa me citou um texto de Clarice Lispector. Não o conhecia e ela citava de memória. Fui atrás do texto original. Estava em suas correspondências. "Até cortar os próprios defeitos pode ser perigoso. Nunca se sabe qual defeito sustenta o edifício inteiro". Claro que é uma frase bem construída e permite, abre espaço para múltiplas reflexões. Uma delas tem a ver com o Psicodrama, com o exercício psicoterápico, com a dramatização no palco psicodramático. Considerando a analogia de Clarice, o nosso edifício pessoal, é construído ao longo do tempo. E os tijolos não são todos do mesmo tamanho nem da mesma qualidade nem do mesmo formato. Mas compõem a parede, a estrutura. Retirá-los, tão somente, levando em conta apenas que eles não seguem o padrão construtivo, pode levar à queda do muro, do edifício inteiro. Daí porque a cena psicodramática permite a vivência no palco das possibilidades aventadas. É como se desse a oportunidade, que não existe no mundo da realidade real, de no mundo da realidade poética, da realidade suplementar, experimentar-se à vera sem ser de verdade. Ou seja, podemos experimentar o mexer de vários tijolos e suas consequências, mas podendo, usando os recursos psicodramáticos, ver-se de fora, repetir, experimentar outras saídas. É verdade: a priori nunca saberemos que defeito sustenta o edifício todo

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E assim é.

Experimentar e refletir.  Este blog é um espaço para mostrar ideias sobre o psicodrama, sobre o teatro espontâneo.  Há mais de trinta anos...