segunda-feira, 30 de janeiro de 2023

Curiar e imaginar

 Lendo um texto, publicado na Revista Brasileira de Psicodrama, escrito por Michele Vasconcelos, Karen Venâncio e Maria Cristina de Carvalho, veio-me a vontade de fazer uma multiplicação dramática do texto. Na Multiplicação Dramática (olá, Pedro!), após uma cena, as pessoas deixando-se levar pela Consonância daquela cena (repercussão em mim) apresentam uma cena (Ressonância). Não é uma cena consequência, não é uma escolha lógica ou racional, não é uma reflexão. É uma Ressonância, uma ação gerada a partir de uma Consonância com a cena-estímulo. A cena ressonante atuada por uma pessoa pode gerar e gera novas consonâncias e. portanto, novas cenas ressonantes. Viver é assim. Não é uma sequencia linear, causal. O ato de viver é preenchido por afetos consonantes e atos ressonantes. Por, isso, Moreno dizia sermos nós seres em relação. O outro, de qualquer forma, consoa em mim. E eu, de qualquer maneira, enceno uma ressonância. Consonância e Ressonância minhas do texto: Minhas pernas começam a sentirem-se inquietas, uma vontade de levantar. Levanto, abro portas, ligo para alguém, pego livro, Minha cena ressonante congela com os braços estendidos, numa posição incômoda. O solilóquio (verbalização do conteúdo que me acontece) é: "Estou muito incomodado, mas estou muito curioso". E, curiosidade está em falta no mercado. E a Imaginação, tema do texto da revista, a louca da casa, está em falta no mercado. Curiar (verbo usado na minha infância para significar ter curiosidade), Imaginar, são coisas arriscosas (como diria Xangai, mestre-cantador). Curiar e Imaginar são ações de expansão no mundo, ações prazerosas e arriscosas. É sair do conhecido, ainda que ruim, mas conhecido. Quando Pompeu dizia a seus soldados romanos "Navigar  necesse est, Viver non est necesse" (navegar é preciso, viver não é preciso) o acento estava em ser a missão maior do que os soldados.. Mas, a palavra Preciso, ser necessário, é homófona de Preciso, exatidão. Então, em navegar há rotas pré-estabelecidas que orientam o rumo, há as estrelas, há os mapas. Em viver, esta exatidão ou pretensa exatidão não existe. Cada ato, ainda que similar a outro, é um ato novo, é uma nova resposta consonante como ato anterior e com o contexto de então. Moreno chamava de Conserva Cultural ao mais do mesmo. ao repetir as rotas já conhecidas. Curiar, imaginar, poetar, encenar, no consultório, na sala de aula, em qualquer lugar ou espaço, existente ou por existir,  no viver, enfim. Obrigado, Michele, Karen e Cris.

quarta-feira, 18 de janeiro de 2023

Alegria? Pode?

 "Aqui jaz aquele que trouxe alegria à psiquiatria". Epitáfio de J.L.Moreno

"Eu nunca vi um fanático ter senso de humor, nem uma pessoa com senso de humor ser fanático" Amós Oz

"Muito riso, pouco siso" provérbio popular

Há alguns dias, conversando em uma live com amigos (Nori Cepeda, Marilene Queiroz, Gueira Vilhena) apareceu a palavra alegria. E veio-me à mente essa expressão popular que relaciona o riso à pouca profundidade de pensamento. Logo a seguir assisti a uma conversa do Dalai Lama com o Cardeal Tutu  em que ambos falam de que a alegria é a alegria da vida significativa, da compaixão. E ambos com vidas de lutas e resistências e sofrimentos atrozes. E ambos riem. A frase do escritor israelense Amós Oz encaixa-se como uma luva. Pode-se ser profundo sem ser fanático. E o fanático não ri porque não considera o outro, só a si e seu pensamento. Diz o cardeal Tutu "uma pessoa é uma pessoa por meio de outra pessoa". Esse é o significado de Ubuntu para o sul-africano. Frase que poderia ser um título de qualquer texto psicodramático. E Moreno, ao falar de alegria não fala da alegria tosca, mas da alegria da compaixão. à Psiquiatria faltava na época (na época?) compaixão, o sentir junto, a dor e a alegria. Isso é compaixão. Compaixão não é ter dó, ter pena. É poder sentir com, sentir junto, alegria ou tristeza. Derrota ou vitória. Perda ou ganho. E o fanático exclui, isola, sobrepõe sua verdade à experiência do outro. Moreno, judeu, Amós, israelense, Tutu, negro do apartheid, Dalai lama exilado de uma terra ocupada. Experiências de vida sofridas e de lutas constantes. Mas todos expressam a alegria da compaixão. 

sexta-feira, 6 de janeiro de 2023

Reflexões

 Como gosto muito de literatura policial, detetives, estava lendo outro dia e me deparei com uma frase em um livro despretensioso, de Chirovici; "Acredito que as coisas que não fizemos nos definem tanto quanto as que fizemos. Aí, para variar, minha cabeça de videoclipe, associou a uma frase de Fernando Pessoa, em seu heterônimo Bernardo Soares, no Livro do Desassossego: "A renúncia é a libertação. Não querer é poder". Como se não fora bastante, lembrei da chamada Confissão de Maat, no julgamento dos  mortos no Antigo Egito que são 42 negativas de ações, afirmações sobre atos que não foram praticados, P. Ex " Eu não pequei. Eu não roubei com violência. Eu não furtei. Eu não assassinei homem ou mulher". Chico e Ruy Guerra na versão de Impossible Dream, dizem "Negar quando é fácil ceder",. Lembrei da desobediência civil de Thoreau, da recusa ao ato violento da Ahimsa Hindu. Ou seja, essa reflexão me pôs na direção da minha vida. Não posso me autodesculpar ou desculpar-me perante os outros por ter sida obrigado a fazer algo. Sempre há a possibilidade da recusa, do não libertador, do não fazer. Claro que todos essas negações têm preço. E alto. Há que se aceitar o preço a ser pago, aceitar a renúncia para haver libertação, 

"Quando tomamos consciência de nosso papel, mesmo o mais obscuro, só então somos felizes. Só então podemos viver em paz e morrer em paz, pois o que dá um sentido à vida dá um sentido à morte". "Terra dos homens" Antoine de Saint-Exupéry

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E assim é.

Experimentar e refletir.  Este blog é um espaço para mostrar ideias sobre o psicodrama, sobre o teatro espontâneo.  Há mais de trinta anos...