domingo, 18 de fevereiro de 2024

Alunos? Mestres

O Pai do Psicodrama, Jacob Levy Moreno, e a Mãe (sim, Zerka Moreno foi a Mãe do Psicodrama atual) quando falavam de papeis. E Papel é  a maneira pela qual pessoas envolvidas em um vínculo exibem traços culturais e pessoais, de forma  ativa e  complementar. E ao falarem da dinâmica dos papéis nos ensinam que ao entrarmos numa relação vincular qualquer, pessoal ou profissional, no primeiro momento, Role Taking (Tomada de Papel), há tanto temores quanto desejos. É quando apreendemos e aprendemos o be-a-ba do papel. É quando parece inalcançável, é quando se precisa persistir ainda que a voz interior diga que não dará certo. Em algum momento, a relação começa a fluir, percebemos, ainda com temor, mas já com alegria e prazer que fazemos direitinho. Esse momento chamamos Role Playing. Um parêntese: a tradução habitual é desempenho. To Play é um verbo muito mais rico do que o verbo desempenhar. To play é atuar (cenicamente), é tocar um instrumento, é jogar, é brincar. Não é, tão só e friamente, desempenhar mecânica e assepticamente. Role-Playing inclui todos aqueles sentidos que perdemos na tradução. Eventualmente, em circunstâncias cruciais, quando os manuais já não nos dão suporte, o supervisor já não tem respostas, algumas criam soluções originais, fora do script. Um salto sem paraquedas na certeza de voar. Role Creating (Criação no papel).  Coração dispara, garganta seca. O estômago contrai. Um parto.  Maiêutica (partejar em grego e em Sócrates) psicodramática. Como os partos, não acontecem sempre. Como os partos, alegria faz par com temor. Como os partos damos à luz uma ação original. Com prazer, alegria e um sincero "como pude fazer isso?". E voltamos a desenvolver a ação partejada. Uma cria nova. E essa história não nem deve ser vista como sucessão de fases. A vida é dinâmica, as relações são dinâmicas. A cada momento podemos passar pelos modos de funcionar. É uma dança circular e continua. E sendo assim, vitaliza as relações entre papéis, elas não se cristalizam, não se fossilizam. Desejar, aprender/apreender, fazer, desejar, aprender, fazer. E criar quando nos permitimos colocar o pé no vazio. A imagem do filhote de passarinho que nunca voou saindo do ninho. As asas foram criadas, mas quem as bate somos nós. Isso não é crença que visa sempre o resultado. Isso é Fé, confiança no método. Salto no escuro.
Esse texto é dedicado aos membros da PROFINT. Alunos? Não. Mestres.

domingo, 11 de fevereiro de 2024

Carnaval e Psicodrama

Carnaval. "Carnis levare", Início dos quarenta dias da Quaresma, quando o comer carne é proibido. Cristianização da Lupercália romana. E nessa festa há o que falar. O calendário romano iniciava-se em março, mês dedicado à principal divindade romana, o deus Marte. Então, no mês anterior era o mês da purificação e da fertilidade. Em 15 de fevereiro (Februarius em Latim, februs = purificação) Era a Lupercália, terceiro dia dessa comemoração. Rito em que homens nus corriam açoitando com tiras de pele de animal todos e, principalmente as mulheres. Ser açoitada por esses chicotes e marcadas pelo sangue do sacrifício, era sinal de fertilidade. Mas, o caos era completo. Caos, sem organização, em que os hábitos eram invertidos, papéis eram invertidos, exibição de uma desinibição sem freios. Esgotava-se o ano civil com essa explosão catártica e fértil. E o nosso Psicodrama? Durante muito tempo o Teatro da Espontaneidade de Moreno foi associado a um happening, a um "laissez faire". A um caos. A quase uma lupercália onde nada é proibido e tudo é permitido. E ainda agora,  a maioria das pessoas associa espontaneidade com descontrole e exposição, "fazer o que dá na cabeça". Algo atemorizante muitas vezes. Espontaneidade, para Moreno, é ter liberdade de se fazer e Criatividade, sempre associada, a capacidade, o poder de fazer a melhor escolha, para a cena, para a vida. Ser mais espontâneo, diminuindo as restrições, é ter mais possibilidades de escolha para o ato criativo. Não falamos nem pensamos, no Psicodrama, na espontaneidade solta, descolada da ação criativa. Espontaneidade sem criatividade é espontaneísmo. Desenvolver, aumentar a Espontaneidade é diminuir as  restrições prévias, os "não pode" antecipados, os prejulgamentos, as pressuposições. Numa atividade psicodramática esse é o objetivo de nosso Aquecimento (Caldeamento, Warming up). E para que? Para possibilitar a escolha da melhor ação criativa na Cena. Seja na Cena, seja na Vida. Espontaneidade é um estado, Criatividade é uma ação. 

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E assim é.

Experimentar e refletir.  Este blog é um espaço para mostrar ideias sobre o psicodrama, sobre o teatro espontâneo.  Há mais de trinta anos...