Aprendemos
cedo na escola que no enunciado de um problema a conjunção e
traduz-se por + na linguagem matemática. Assim, 1+1 é
igual a 1 e 1. Aprendemos também que não se pode somar
quantidades heterogêneas. Deste modo o nosso título seria
“Psicoterapia + Pedagogia” reconhecendo que não são quantidades
heterogêneas. O que a matemática nos mostra de forma tão fácil e
transparente necessita de muitas letras para ser demonstrado em
linguagem verbal.
É
costume colocar-se o ato pedagógico como sendo apenas do contexto
educacional deixando o ato psicoterápico apenas no contexto
terapêutico. Claro que colocar o aprendiz de psicoterapeuta em
terapia pressupõe não apenas o aspecto terapêutico, mas,
principalmente, o aprendizado de um papel por meio do seu
complementar. Ao se colocar como cliente o aprendiz assume o papel
complementar ao de terapeuta. Ele experimenta em si as ações
daquele papel que, enfim, é o que busca. Aqui vemos um ato
psicoterápico que se completa em um ato pedagógico. E o inverso? Um
ato pedagógico pode se completar em um ato psicoterápico?
Imaginemos um adulto analfabeto. Ele não compreende o que está
escrito, as coisas lhe acontecem, de um letreiro de ônibus a um
documento, sem que ele compreenda. Não consegue intervir naquele
mundo onde tudo se baseia na linguagem escrita. Está, portanto,
alienado deste contexto humano. Ao ser alfabetizado, um mundo se abre
para ele, uma nova visão de mundo, um novo enfoque. Ele passa a ter
instrumentos para intervir onde antes era alienado. Isto não é uma
descrição de um processo psicoterápico? Propicia a desalienação
e uma nova visão de mundo associadas à potência de ação,
intervenção. Na alfabetização o processo é mais nítido por ser
um gradiente maior: analfabeto X alfabetizado. Porém, qualquer
acréscimo cultural tem algum grau de poder desalienador e
libertador. E como tal, a intervenção pedagógica, o ato
pedagógico, tem seu forte conteúdo terapêutico. A gangorra, agora,
volta-se para o ato psicoterápico. Temos por base que psicoterapia
não é apenas a remoção de sintomas. Seu objetivo maior é ajudar
a produzir a desalienação do indivíduo, liberando sua
espontaneidade criatividade para a sua efetiva afirmação no mundo.
Isto, contudo, não se faz por ato do terapeuta. Quando numa terapia,
o poder de mudança, de transformação alquímica pertence ao
terapeuta ou lhe é dado pelo cliente, configura-se uma relação de
dependência, de dominação, superior, talvez, a uma dependência
química. O terapeuta não é o mágico que tira soluções da
cartola para o cliente plateia. Terapia vem de uma raiz grega com o
significado de ajuda, auxilio. Como o processo psicoterápico se
torna terapêutico e não, iatrogenicamente, gerador de dependência?
Quando o cliente aprende a fazer aquilo sozinho! Quando o cliente se
transforma em seu próprio terapeuta! Tal qual o aprendiz de
terapeuta quando faz sua terapia didática. A psicoterapia só se
torna terapêutica quando ela é pedagógica.
Educação
provém de uma raiz latina – ex-ducere - que
significa conduzir para fora. Existe algo já dentro do indivíduo
que o educador ajuda a fazer o parto (maieutica). O contrário disto
é a instrução em que o saber vem do instrutor sendo introduzido no
aluno. Similarmente, o ato psicoterápico ajuda aquilo que já existe
no indivíduo a vir à luz. O modelo intervencionista, autoritário,
em que o saber terapêutico pertence ao terapeuta é um modelo de
instrução, não de educação: preserva o gradiente cliente aluno X
terapeuta professor. A inversão de papéis cliente terapeuta jamais
se concretizaria numa relação tão rigidamente posta e esse é o
objetivo do ato terapêutico pedagógico: a inversão de papéis em
que o cliente toma o papel de terapeuta, sendo seu
próprio terapeuta, dispensando, finalmente, a ajuda do terapeuta
parteiro. Em outro momento, outro papel, talvez novo parto se
anuncie.
querido tom, estou animada pelo que já li até agora.
ResponderExcluirdesde que me encorajou a escrever sobre psicodrama e vida tenho me posto a pensar por onde começo.
você trouxe essa analogia com a pedagogia com sabedoria e leveza, foi assim que chegou em mim.
agradeço pela sua disponibilidade de oferecer ouro puro.
logo menos compartilho com você meus escritos, abraço!!
nataxes