terça-feira, 27 de dezembro de 2016

Antevisão de Moreno

 “Minha filosofia tem sido mal entendida e desconsiderada em muitos círculos científicos e religiosos. Isto não me impediu de continuar a desenvolver técnicas provenientes da minha visão de como o mundo deveria ser estabelecido. É curioso o fato de que esses métodos – sociometria, psicodrama, terapia de grupo – criados para implementar uma filosofia fundamenta de vida subjacente, têm sido universalmente aceitos, enquanto a Filosofia é relegada aos cantos escuros das estantes das bibliotecas ou de todo esquecidas”.
 in Autobiografia

domingo, 25 de dezembro de 2016

Poema de Moreno - As Palavras do Pai

AS PALAVRAS DO PAI – XX
(Jacob Levy Moreno)

Esta é a minha oração:
Que todos os seres sejam benditos
Com um lugar no Universo,
Com um lugar no sol,
Ou um lugar na lua.
Não importa onde,
Se é um lugar onde possas criar-Me.
Eu consegui para todos
Um lugar no universo.
Vá e assume o teu.
Esta é a minha casa: o Universo.
Eu a dividi.
Que todos os seres sejam abençoados com um lar,
Um lugar no universo.
Que tu sejas bendito
Com um lar.
Que o Universo seja o teu lar.
Eu fiz espaços tão imensos
Para que todos possam encontrar
Um lugar nele.

Te desejo Vida

sexta-feira, 23 de dezembro de 2016

Ato psicoterápico e ato pedagógico


Aprendemos cedo na escola que no enunciado de um problema a conjunção e traduz-se por + na linguagem matemática. Assim, 1+1 é igual a 1 e 1. Aprendemos também que não se pode somar quantidades heterogêneas. Deste modo o nosso título seria “Psicoterapia + Pedagogia” reconhecendo que não são quantidades heterogêneas. O que a matemática nos mostra de forma tão fácil e transparente necessita de muitas letras para ser demonstrado em linguagem verbal.
É costume colocar-se o ato pedagógico como sendo apenas do contexto educacional deixando o ato psicoterápico apenas no contexto terapêutico. Claro que colocar o aprendiz de psicoterapeuta em terapia pressupõe não apenas o aspecto terapêutico, mas, principalmente, o aprendizado de um papel por meio do seu complementar. Ao se colocar como cliente o aprendiz assume o papel complementar ao de terapeuta. Ele experimenta em si as ações daquele papel que, enfim, é o que busca. Aqui vemos um ato psicoterápico que se completa em um ato pedagógico. E o inverso? Um ato pedagógico pode se completar em um ato psicoterápico? Imaginemos um adulto analfabeto. Ele não compreende o que está escrito, as coisas lhe acontecem, de um letreiro de ônibus a um documento, sem que ele compreenda. Não consegue intervir naquele mundo onde tudo se baseia na linguagem escrita. Está, portanto, alienado deste contexto humano. Ao ser alfabetizado, um mundo se abre para ele, uma nova visão de mundo, um novo enfoque. Ele passa a ter instrumentos para intervir onde antes era alienado. Isto não é uma descrição de um processo psicoterápico? Propicia a desalienação e uma nova visão de mundo associadas à potência de ação, intervenção. Na alfabetização o processo é mais nítido por ser um gradiente maior: analfabeto X alfabetizado. Porém, qualquer acréscimo cultural tem algum grau de poder desalienador e libertador. E como tal, a intervenção pedagógica, o ato pedagógico, tem seu forte conteúdo terapêutico. A gangorra, agora, volta-se para o ato psicoterápico. Temos por base que psicoterapia não é apenas a remoção de sintomas. Seu objetivo maior é ajudar a produzir a desalienação do indivíduo, liberando sua espontaneidade criatividade para a sua efetiva afirmação no mundo. Isto, contudo, não se faz por ato do terapeuta. Quando numa terapia, o poder de mudança, de transformação alquímica pertence ao terapeuta ou lhe é dado pelo cliente, configura-se uma relação de dependência, de dominação, superior, talvez, a uma dependência química. O terapeuta não é o mágico que tira soluções da cartola para o cliente plateia. Terapia vem de uma raiz grega com o significado de ajuda, auxilio. Como o processo psicoterápico se torna terapêutico e não, iatrogenicamente, gerador de dependência? Quando o cliente aprende a fazer aquilo sozinho! Quando o cliente se transforma em seu próprio terapeuta! Tal qual o aprendiz de terapeuta quando faz sua terapia didática. A psicoterapia só se torna terapêutica quando ela é pedagógica.

Educação provém de uma raiz latina – ex-ducere - que significa conduzir para fora. Existe algo já dentro do indivíduo que o educador ajuda a fazer o parto (maieutica). O contrário disto é a instrução em que o saber vem do instrutor sendo introduzido no aluno. Similarmente, o ato psicoterápico ajuda aquilo que já existe no indivíduo a vir à luz. O modelo intervencionista, autoritário, em que o saber terapêutico pertence ao terapeuta é um modelo de instrução, não de educação: preserva o gradiente cliente aluno X terapeuta professor. A inversão de papéis cliente terapeuta jamais se concretizaria numa relação tão rigidamente posta e esse é o objetivo do ato terapêutico pedagógico: a inversão de papéis em que o cliente toma o papel de terapeuta, sendo seu próprio terapeuta, dispensando, finalmente, a ajuda do terapeuta parteiro. Em outro momento, outro papel, talvez novo parto se anuncie.

quarta-feira, 21 de dezembro de 2016

Personagens

E o que é uma personagem? Nas artes cênicas a personagem é constituída de vestuário e adereços, mímica corporal (pantomima), fala e suas tonalidades, conteúdo e coerência do discurso, conteúdo do pensamento, história pessoal com sua origem, eventos e relações afetivas. Mas a personagem nas artes é única, é ela é apenas o que é. O ser humano é diferente. Suas personagens são criadas e recriadas ao longo da vida. Cada ser humano é um palco onde podem estar em cena, simultaneamente ou não, múltiplas personagens. Identificar as personagens e suas histórias, descobrir sua gênese, reconhecer os papéis complementares, os cruzamentos de histórias no mesmo palco, as interferências entre personagens e histórias diferentes, as relações entre os papeis complementares de personagens diferentes. Isto é o palco psicodramático. Isto é Psicodrama.

sábado, 17 de dezembro de 2016

Calvino e a direção psicodramática


Andei relendo Ítalo Calvino em seu “Seis propostas para um novo milênio”. Neste seu livro, último livro e seu legado, ele trabalha com seis valores que considera essenciais para a literatura do novo milênio (o livro é de 85). São eles: LEVEZA, RAPIDEZ, EXATIDÃO, VISIBILIDADE, MULTIPLICIDADE E CONSISTÊNCIA. Penso se não serão estes os atributos de um Diretor de Psicodrama. Partindo do fim para o princípio, na ordem inversa de citação, temos o lastro teórico (CONSISTÊNCIA), a abertura para novas possibilidades (MULTIPLICIDADE), a capacidade de tornar visível o sub texto (VISIBILIDADE), a precisão técnica no momento adequado (EXATIDÃO), a capacidade de resposta breve (RAPIDEZ) e, essencialmente, a mão leve ao dirigir, a sutileza, a delicadeza de ação (LEVEZA). Ler Calvino é sempre muito bom.

segunda-feira, 12 de dezembro de 2016

Um pensar na Sociometria.

Sociometria é, em Psicodrama ou Socionomia, o estudo e medida das redes vinculares em um grupo. E o Teste Sociométrico, seu instrumento principal, é lastreado nas escolhas para um dado critério. Mas podemos olhar para a Sociometria por um angulo complementar. E mais simples para o trabalho terapêutico. Em qualquer escolha é fundamental desvelar em que critério a escolha foi feita. Quaisquer que sejam as escolhas é tarefa psicoterápica desvendar o critério oculto. A linguagem comum tende a falar de escolhas como se elas fossem universais. O pior colega. A mulher de minha vida. Traíra. Como se essa escolha definisse todos os critérios possíveis. É difícil se pensar que ser um cafajeste em um critério não pressupõe que o seja em outro critério. Pode não sê-lo. Em Filosofia aprendemos as falácias dos argumentos. Um deles é o argumento de autoridade. Ser uma autoridade reconhecida em um campo não serve para transferir essa autoridade para um outro campo diferente. Um atleta pode ser autoridade em seu campo de atuação, mas falar de um medicamento ou de um empreendimento imobiliário é um argumento de autoridade. O pensamento sociométrico leva a este questionamento: qual o critério que levou esta pessoa a ser escolhida? Para o bem ou para o mal, as pessoas se definem em cada relação.

quinta-feira, 8 de dezembro de 2016

E outra vez Pessoa

Em “Autopsicografia” diz Fernando Pessoa: "O poeta é um fingidor. Finge tão completamente que chega a fingir que é dor a dor que deveras sente. E os que leem o que escreve, na dor lida sentem bem. Não as duas que ele teve, mas só a que eles não têm.” Os participantes, quando não aquecidos, não envolvidos, sentem apenas a que eles não tem. O Protagonista finge (dramatiza) a dor que ele tem e estas são as suas duas dores: a sentida e a dramatizada.

quarta-feira, 7 de dezembro de 2016

Nietzsche

Em última instância, o homem não encontra nas coisas senão o que ele mesmo haja nela posto. Este voltar a encontrar, se chama Ciência; introduzi-lo se chama Arte.”

domingo, 4 de dezembro de 2016

o adoecer de uma relação terapeutica

O que constitui uma relação terapêutica? O que faz de uma relação qualquer ser reconhecida como terapêutica? O que é uma relação? E o que é adoecer? Se, e quando, precisamos refletir sobre um tema, uma boa forma é discutir os termos do pedido. Isto nos abre um guia e nos mostra um norte.
Estando duas ou mais pessoas em uma mesma situação a relação se estabelece quando há algum tipo de conexão, ligação entre elas. Com qualquer sinal afetivo. Mas com um sinal afetivo presente. Sem um sinal afetivo as pessoas apenas compartilham um espaço. E quando uma relação estabelecida, ou seja, uma conexão afetiva estabelecida, ganha a conotação de relação terapêutica? Quando existe uma relação de alguém em um papel diferenciado com outro em um papel indiferenciado. E se essa relação se estabelece entre um alguém em um papel profissional com alguém em um papel indiferenciado de paciente ou cliente, essa relação é uma relação psicoterapêutica. Indo a outro termo, temos o adoecer. Em linguagem médica adoecer é padecer de uma enfermidade. Em linguagem coloquial, o adoecimento é sinônimo de destrutividade: casamentos doentes, trabalhos adoecedores, comportamento doentio. Para Moreno, adoecer era perder a espontaneidade, a prontidão da resposta exata e adequada, é estar disponível (Espontaneidade) para a melhor resposta (Criatividade). E agora precisamos de outro termo já aqui citado. Moreno, em sua Teoria de Papeis, fala de diferenciação e indiferenciação. Paremos e olhemos e vejamos. Esses termos são claramente tirados da terminologia biológica. A célula inicial, o ovo, é dito indiferenciado. À medida do desenvolvimento dessa célula matriz ela vai se diferenciando, ou seja, vai se especializando em múltiplas funções. De uma célula inicial surge um filhote, uma criança. Tudo que está na criança formada já estava na célula matriz. Mas, uma célula é uma célula e uma criança é uma criança. O que as difere? A diferenciação celular, a múltipla especialização para tornar-se um organismo. E, também em Medicina, o Câncer é a multiplicação desordenada de células indiferenciadas. Estas não são produtivas, não são funcionais. E terminam por destruir o organismo. E Moreno era médico. E tinha conhecimento dessa terminologia. Ao, por analogia, nomear os papéis como diferenciados ou indiferenciados, estava usando nesse contexto. E o que são, finalmente, papeis assim denominados? Diferenciado está em um papel aquele que ao agir não age por impulsividade, guiado apenas pelo desejo, confusão, afeto momentâneo. Diferenciado está em um papel quando sua espontaneidade não está comprometida pelo não reconhecimento do afeto dominante. E o oposto para a indiferenciação. Alguém está indiferenciado no papel quando sua ação é espontaneísta, impulsiva. A Espontaneidade Moreniana sempre está associada à palavra adequação. Espontaneidade não é fazer o que lhe vem à cabeça no momento e inadequadamente. É poder fazer tudo e poder escolher o melhor. É aí que o Teatro Espontâneo nos auxilia a entender. A resposta do ator espontâneo há que ser pronta e rápida, mas tem que se adequar ao ritmo, ao contexto, à necessidade cênica. Ser Espontâneo é não estar proibido. Seja pelos agentes externos ou internos. A estes últimos, Boal chamava de O Tira (policial) na Cabeça. Ser Criativo é escolher a melhor resposta.
Juntando todos esses conceitos discutidos, repensemos o título da mesa. O ADOECER DA RELAÇÃO. Recoloquemos o título à luz do que já vimos. Como uma relação psicoterápica entre um profissional e seu paciente torna-se destrutiva? Como, por definição, uma relação psicoterápica é uma relação assimétrica, afinal um chega e outro está. Existe um movimento de busca por parte de um (o paciente) dirigido a outro. Um paga e outro recebe. Essa assimetria da relação prossegue no exercício terapêutico. Um está confuso, sofrendo, angustiado, nebuloso. O outro deverá estar em diferente estado. Como diria Fernando Pessoa “Sentir tudo de todas as formas”. Mas, saber o que está sentindo e ter a clara percepção a cada momento do que está dirigindo a sua ação. Se a necessidade cênica ou sua necessidade afetiva. Quando a necessidade afetiva do Psicoterapeuta, do Condutor de Psicodrama, dirige sua ação ele se não diferencia no papel. A relação psicoterápica deixa de ser assimetricamente terapêutica para tornar-se simetricamente doentia. A Espontaneidade Criativa do condutor de Psicodrama ou qualquer outra forma psicoterápica estará comprometida. Ele já não faz o que é necessário, faz o que apenas quer. E cabe ao terapeuta perceber o que está acontecendo. É função de seu papel. Mas, se porventura, é o paciente ou o grupo que percebe isto, nesse exato instante quem assume o papel terapêutico são eles. Mas isto se acontecer não pode ser uma rotina. Moreno dizia que o Diretor de Psicodrama é um membro do grupo em papel diferenciado. E ele continuará sendo enquanto se mantiver com esta nitidez de percepção. Se não, é o paciente/grupo que assumirá este papel.
Penso que uma relação psicoterápica adoece quando o psicoterapeuta indiferencia-se no seu papel quebrando a necessária relação assimétrica da terapia.

quarta-feira, 30 de novembro de 2016

Lentes, instrumentos e outras coisas

Olhar uma cena psicodramática ou qualquer cena implica em usar dois instrumentos de naturezas opostas. Duas lentes diferentes. Grande angular e teleobjetiva. Telescópio e microscópio.Talvez não sejam analogias perfeitas, mas é  ver o detalhe e ver o contexto. Ver o micro gesto e ver o grupo. Ver o ritmo do protagonista e o aquecimento do grupo. Qualquer um dos dois isolados perde sua eficácia e cria certezas anômalas. Indivíduo e grupo. Dirigir Psicodrama com lentes complementares.

segunda-feira, 28 de novembro de 2016

Zen, Psicodrama...

Uma expressão ZEN pergunta: uma árvore caindo sozinha numa floresta sem nenhum ser humano, faz barulho? Na época antiga em que isto foi escrito não havia microfone ou gravador. Apenas o ouvido humano. Mas, a dúvida se impõe. Sem a interação com o ouvido humano ou seus substitutos modernos, há barulho? Não. Barulho é interação. Entre o agente que faz o ruído e alguém ou algo que ouve. Essa expressão ZEN está inteiramente dentro do espírito psicodramático. Ao Psicodrama importa o que acontece na interação entre o objeto que cai (árvore) e o ouvido que ouve, resultando em um barulho. É a isto que Moreno colocava como pedra fundamental: o ser humano é um ser em relação. Árvore, ouvido são distintos, juntos criam o barulho. E há ainda a AÇÃO de cair. Sem a ação nada há. Nada haverá.

sábado, 26 de novembro de 2016

Ainda surpreende!

Interessante como, mesmo depois de muito tempo, é surpreendente que o método psicodramático seja tão potente, eficiente e eficaz. Em uma supervisão de caso e em uma vivencia estendida do papel de agente de saúde mental. O mero falar e falar sobre algo, sem a experiência direta, sofre uma sacudidela quando exposto ao fazer dramatizado. É isto que surpreende: quem vivencia uma dramatização tem o aprendizado desde seu interior, construído e exibido na sua relação com o outro.

terça-feira, 22 de novembro de 2016

Novamente Pessoa

  • Em “Autopsicografia” diz Fernando Pessoa: O poeta é um fingidor. Finge tão completamente que chega a fingir que é dor a dor que deveras sente. E os que leem o que escreve, na dor lida sentem bem. “Não as duas que ele teve, mas só a que eles não têm.” O protagonista finge a dor que tem e estas são as suas duas dores: a sentida e a dramatizada. Os participantes, quando não aquecidos, não envolvidos, sentem apenas a que eles não tem.

segunda-feira, 21 de novembro de 2016

Difícil, mas possível.

Olhar o mundo dentro da visão psicodramática, socionômica não é fácil. Nosso hábitos, nossas conservas culturais, nos fazem pensar como se o mundo fosse construído a partir de mim, por mim e para mim. E mesmo dentro do mundo psicodramático, fora do palco e às vezes dentro do palco, nas discussões teóricas, aparece sempre o viés explicativo, causal. O fundo fenomenológico não surge no dia a dia do socionomista, psicodramista. Pensar em termos psicodramáticos implica em mudar radicalmente a nossa forma de ver. Implica em que o conceito de ser em relação, é mais do que um conceito. É sair da perspectiva individualista e incluir o outro necessariamente. O outro nos constitui tanto quanto constituímos o outro. Em termos psicodramáticos dizemos que as pessoas se vinculam por meio de papéis. E os papéis só existem porque existem os contra papéis, os papéis complementares. Não existe o papel de médico enquanto ele não está vinculado a alguém que assume o papel de paciente. E vice-versa. Só há o papel de paciente se houver quem assuma o papel de médico. O resultado de se vivenciar isto, e não apenas saber teoricamente, é, diante de cada situação, esclarecer ou desvelar a relação de papel - contra papel. Moreno dizia que o intrapsiquíco é importante, mas ao Psicodrama importava o interpsiquico, o que acontecia na relação interpessoal. 

quinta-feira, 17 de novembro de 2016

Palco

O palco é um instrumento vital ao Psicodrama. E palco não é o tablado, mas o espaço cênico. Pode não haver um praticável, uma elevação qualquer. Mas, os limites entre o palco e a plateia precisam ser delimitados. E para que? O espaço cênico, o palco, a cena, é o reino do papel psicodramático, da verdade poética. É lá que é seu locus. Fora do palco é o reino da verdade factual, da realidade real. Entrar e sair do palco implica em entrar e sair do mundo do "como é" para o mundo do "como se". Por isto o Diretor/Condutor não deve ficar nesse palco. Ele pertence ao mundo do "como é" ajudando a produzir o mundo do "como se". Esse limite, essa "brecha real/fantasia" é a borda do palco. O mero entrar e sair não é tão simples. É uma profunda operação cognitiva/afetiva. Leva o participante, ao tornar-se personagem e voltar ao seu lugar, a fazer de forma suave a alternância de mundos. Aprender a operar e manejar esta viagem é o grande salto do Psicodrama. Até o Espelho como uma das técnicas base do Psicodrama só tem sentido se visto por este angulo. Sair do palco para ver sua cena em espelho equivale a voltar ao o real e ver sua fantasia tornada real. Ver-se verdadeiramente de fora para dentro. 

terça-feira, 15 de novembro de 2016

Quintana

"Quem faz um poema abre uma janela.
Respira, tu que estás numa cela abafada,
esse ar que entra por ela.
Por isso é que os poemas têm ritmo
- para que possas profundamente respirar.
Quem faz um poema salva um afogado."

segunda-feira, 14 de novembro de 2016

Distensão muscular em TE/Psicodrama?

O aquecimento (warming-up, caldeamiento) em Teatro Espontâneo/Psicodrama/Sociodrama (tudo incluído na Socionomia Moreniana) é similar àquilo que acontece na atividade física. Antes de qualquer atividade física é necessário preparar os músculos para o esforço que será feito. E a depender do esforço, da atividade, o aquecimento físico  será diferente. Sem aquecimento acontecerá uma distensão muscular, um dano qualquer. Tal e qual em nossa atividade. Aquecer é preparar o grupo para o que virá, é exercitar aquilo que será necessário para a dramatização. e a espontaneidade e criatividade têm seu veículo no corpo. Mas o grupo não surge por milagre. Antes do aquecimento temos um agrupamento de pessoas em seus papeis sociais. Ao aquecer possibilitamos a grupalização, o sentimento de pertinência a um grupo. A partir daí as dramatizações podem acontecer. Um aquecimento malfeito gera o equivalente a uma distensão muscular, à lesão muscular: "a resistência" daquele agrupamento, a não existência de espontaneidade e criatividade, o sentimento de exposição, a sensação de que o diretor o está carregando, a exaustão do diretor/condutor. O aquecimento estará terminado quando a ação grupal se anuncia, seja em um riso coletivo, seja na cooperação voluntária, seja a nítida sensação do agrupamento olhar para o mesmo ponto. É grupo, então. "Todo o tempo que o Diretor/Condutor investe em aquecimento ele recupera na etapa de dramatização" (Moysés Aguiar).

sexta-feira, 11 de novembro de 2016

Moreno e Raul Seixas


PALAVRAS DO PAI
Eu sou o arqueado
Que se curva ao te levar.
Eu sou a mesa posta
Para te alimentar.
Eu sou a semente que cresce
Para te multiplicar.
Eu sou o seresteiro
Que canta para te alegrar.
Eu sou o passarinho
Que voa a te inspirar.
Eu sou a estrela
que brilha ao te coroar. (MORENO, 1992, p. 42).
GITA
 Eu sou a luz das estrelas,
 Eu sou a cor do luar, 
 Eu sou as coisas da vida,
 Eu sou o medo de amar,
 Eu sou o medo do fraco,
 A força da imaginação,
 O blefe do jogador,
 Eu sou, eu fui, eu vou.
 Eu sou o seu sacrifício,
 A placa de contramão
 O sangue no olhar do vampiro,
 E as juras de maldição,
 Eu sou a vela que acende,
 Eu sou a luz que se apaga,
 Eu sou a beira do abismo,
 Eu sou o tudo e o nada.
Gita (Raul Seixas, Paulo Coelho)

quinta-feira, 10 de novembro de 2016

Paralaxe????

Lá nos idos do 2º grau aprendi em Física algo chamado Paralaxe. Trata-se da mudança de perspectiva entre figura e fundo pela mudança de posição do observador. Algo que ocorre quando olhamos o dedo indicador com apenas um olho aberto e depois alternamos o fechamento dos olhos. Esta mudança de posição relativa entre dedo e o fundo é a Paralaxe. E o que tem de análogo com o Psicodrama? Aqui quando reencenamos uma história, quando experimentamos outro final para ela, quando fazemos um espelho, duplo, inversão de papeis, quando usamos todos estes instrumentos de trabalho psicodramático, sempre o fazemos com o objetivo de permitir ao observador participante (grupo e/ou indivíduo) uma ou várias outras miradas novas da mesma cena. Isto é o que se torna o verdadeiro instrumento terapêutico do Psicodrama: a possibilidade de que o grupo e/ou indivíduo possa sair da visão única, cristalizada (talvez até patologizada) que até então acontecia para um horizonte de outras formas de ver. Sim, fazer Psicodrama é ajudar a construir múltiplos pontos-de-vista, é descongelar a visão de mundo. É fazer um movimento de Paralaxe existencial em que, sem que nada mude na superfície, algo se altere profundamente.



terça-feira, 8 de novembro de 2016

A agulha e a mão

Há uma letra de Gilberto Gil que me encanta e define. A música é A linha e o Linho. Logo no começo há este verso: A agulha do Real nas mãos da Fantasia. Já havia ouvido muito essa música, mas em um dia especial eu a escutei. E ela me pegou. Estava escrevendo um texto sobre Teatro Espontâneo e esse verso me entrou pelos ouvidos da alma. Teatro Espontâneo, Psicodrama, Sociodrama. Tudo o que Moreno criou, Gilberto Gil sintetizou. Nossa agulha do real está nas mãos da fantasia. Nosso fazer é isto. Temos instrumentos do mundo real (nosso método socionômico),  nossa agulha é concreta. Mas está nas mãos da louca da casa: a fantasia, a imaginação. 

segunda-feira, 7 de novembro de 2016

Anamnese???

Contar uma história tem um cunho terapêutico por nos obrigar, ao contar, a impor uma ordem, uma cronologia, a dar um sentido. O como se conta interfere no significado de uma história. Um mesmo enredo pode ser contado como tragédia ou comédia. Uma mesma personagem pode ser vilã ou herói. Então, quando em consultório fazemos uma anamnese não atentamos para o significado dessa palavra tão técnica, tão ligada ao atendimento em saúde. Anamnese em grego quer dizer relembrar, trazer à tona da memória o que estiver submerso no esquecimento. Anamnese é uma história. O profissional ajuda o contador da história, aí chamado de paciente ou cliente, a organizar, encontrar sentido em uma massa de informação. Uma boa anamnese é simplesmente uma boa história já editada. Contar sua própria história é terapêutico em si.  O profissional é somente o editor.

sábado, 5 de novembro de 2016

May ou Can?

Penso que há uma maneira analógica de se compreender a espontaneidade e a criatividade. Como o inglês é uma linguá corrente, vamos usá-lo. Os verbos MAY e CAN. Ambos são traduzidos em português como Poder. Há diferenças de sentido. O primeiro, May, dá a conotação de permissão, traduzido como Eu posso? O segundo, Can, é traduzido como Eu posso. O primeiro  posso é permissivo. O segundo posso é realizador. O primeiro possibilita, permite. O segundo age. Ao verbo MAY associo a ESPONTANEIDADE. Ao verbo CAN associo a CRIATIVIDADE. Espontaneidade é não ter bloqueios prévios, negativas antecipadas, impossibilidades fantasiadas. Criatividade é poder escolher a melhor ação dentre todas as disponíveis, a mais útil, a mais rentável, a que dê origem ao movimento construtivo. Espontaneidade é se permitir, poder tudo. Criatividade é dentre este tudo poder escolher o mais adequado.

quarta-feira, 2 de novembro de 2016

E o que mais pode ser?

Quando pensamos ou falamos em Sociometria pensamos e falamos do Teste Sociométrico. Mas podemos também pensar, quando falamos em Sociometria, no caminho inverso,  em que toda escolha pressupõe um critério. No senso comum a escolha parece ser universal, atingir todos os papéis. É um exercício útil, ao se ouvir uma escolha, o resultado de uma escolha, perguntar em que critério ela foi feita. Para mim esta é a essência da Sociometria: toda escolha pressupõe um critério e desvelá-lo, ajudar a trazer à luz este critério, é Psicodrama.

Só para raros, só para loucos


"O Homem não é uma forma fixa e duradoura (tal era a ideia dos antigos, apesar do pensamento em contrário de alguns luminares da época); é antes um ensaio e uma transição, não é outra coisa senão a estreita e perigosa ponte entre a NATUREZA e o ESPÍRITO. Para o ESPÍRITO, para Deus, ele é impulsionado pela vocação mais íntima. Para a NATUREZA, para a Mãe, é atraído pelo mais íntimo desejo."

Hermann Hesse - Lobo da Estepe

segunda-feira, 31 de outubro de 2016

É para isto mesmo

Esperar a situação ideal é ilusório. O método Psicodramático ou Socionômico pressupõe que tomemos a realidade tal como ela se apresenta. O Diretor/Condutor não carrega o grupo, não é o responsável solitário pelas decisões e escolhas; cabe ao Diretor/Condutor, seguindo o método Socionômico, ter sempre em mente que ele é membro do grupo, em papel diferenciado; trazer para o grupo os problemas e dificuldades porque ao grupo cabe encontrar a forma melhor e adequada de lidar com estes percalços. Enfim, o método Socionômico é a nossa ferramenta para lidar com as dificuldades operacionais. Há que se viver o método, tornando-o parte inerente do exercício de todos, todos mesmos, instantes da atividade grupal. Ou seja, dificuldades e problemas podem ser aquecimento.

sexta-feira, 28 de outubro de 2016

Falar de Psicodrama?

Falar ou escrever sobre Psicodrama não é fácil. Estar em um painel de expositores sobre métodos psicoterápicos não é fácil. E o que é difícil? O que me faz ter dificuldades? Geralmente, então, peço para ser o último. Fico observando o público e como eles ouvem os conceitos emitidos. Não sei, claro, se os compreendem todos e completamente. Não sei nem se os compreendem parcialmente. mas sei que não se surpreendem com as palavras. Eles todos já as conhecem. Os conceitos podem não ser entendidos, mas as palavras não são estranhas. Quando chega a minha vez instala-se um problema. As nossas palavras técnicas são estranhas ao uso cotidiano na visão do senso comum. Elas fazem sentido quando ouvidas num universo artístico. Não num universo psicoterápico. É isto a nossa dificuldade de falar em 15 minutos ou vinte sobre Psicodrama. Cada palavra, cada conceito precisa ser definido. E quando é definido não parece ao público como uma coisa "séria". Quando o falar sobre Psicodrama acontece depois de uma experiência vivenciada os conceitos já foram sentidos e vividos e as nomeações feitas fazem sentido. Por isto, quando sou convidado para uma mesa dessas prefiro falar do que Psicodrama não é. Não é teatro, não é happening, não é porra-louquice. Não é teatrinho nem mágica, enfim.

quinta-feira, 27 de outubro de 2016

Ícaro

Ícaro quis chegar ao Sol.  Suas assas coladas com cera derreteram-se. E ele caiu. Presunção e vaidade são os inimigos ocultos, invisíveis da direção psicodramática. Presunção e vaidade tornam indiferenciado o condutor de grupo em seu papel diretivo. E ao indiferenciar-se, isola-se do grupo e por ele é isolado. E ele cai. Como diz o amigo e mestre Paulo Amado, o diretor é cego. Seus olhos são o grupo.

terça-feira, 25 de outubro de 2016

Fernando Pessoa e o Teatro Espontãneo

  • Em um apontamento de Fernando Pessoa, sob o heterônimo de Ricardo Reis, ele diz que Poesia não é um derramamento de emoção, mas sim a emoção submetida à disciplina do ritmo e da métrica. Em outro poema - ISTO – ele diz: “Dizem que finjo e minto tudo o que escrevo. Não. Eu simplesmente sinto com a imaginação. Não uso o coração”. Não vejo melhor definição de Teatro Espontâneo. O protagonista sente com a imaginação e tem sua emoção sob a disciplina do ritmo e da estética. Este é o antídoto do espontaneísmo e da impulsividade histriônica.

segunda-feira, 24 de outubro de 2016

O ínicio antes do começo

Talvez seja importante, talvez não. Para mim, é. Toda e qualquer atividade que envolva Psicodrama/TE ou não, procuro chegar cedo e aguardar a plateia. Quando chego e já encontro as pessoas no local, o grupo sociometricamente já começou a se constituir. Somos nós quem teremos de nos inserir. O contrário acontece quando já estou na chegada das pessoas. O grupo vai se construindo comigo e posso estabelecer vínculos gradualmente. O aquecimento grupal começa, desta forma, antes do começo oficial da atividade, sem o formalismo de todo inicio. E, enfim, quando começa, só para alguns poucos será o começo. A grupalização para a maior parte das pessoas foi acontecendo suavemente, lentamente, amorosamente.

sábado, 22 de outubro de 2016

Ser espontâneo e Ser pensante

Espontâneo? Impulsivo, irrefletido, infantil, irracional. Pensante? Reflexivo, ponderado, adulto, racional. Parece ser esta a equação mais comum no senso comum: Espontaneidade como antônimo existencial do Pensamento. Como se tivéssemos de fugir de um em direção a outro conceito. Talvez porque atribuímos à espontaneidade a ideia de fazer o que quiser. Fazer o que se tem vontade, pouco ou nada ligando ao sentir do outro. Atributos da imaturidade e egoísmo! Pode não ser dito, mas é, sim, o conceito implícito em espontaneidade no senso comum. E a Socionomia. E o Psicodrama? E o Sociodrama? E o Teatro Espontâneo? Todos lastreados no conceito fundamental de Espontaneidade Criativa. É bonitinho de se ver, é interessante, mas não é sério. Moreno sempre acrescentou ao conceito de espontaneidade a palavra adequação. Outra palavra complicada! Adequação soa como ajustamento, domesticação, docilidade. E Moreno se pretendia revolucionário!!!! Como pode? Uma palavra fora de contexto pode mudar seu conceito. A possibilidade da resposta adequada, morenianamente falando, significa a melhor, mais criativa, mais surpreendente, a menos repetitiva, a menos condicionada, a menos mumificada, resposta. Ser espontâneo é aumentar o conjunto Universo das possibilidades. Ser criativo é escolher a melhor possibilidade. E isto é o Pensar Espontâneo e Criativo.

 

quarta-feira, 19 de outubro de 2016

O que preciso?

O Teatro Espontâneo se sustenta no aquecimento, no ritmo e na estética. Como quem participa não tem o compromisso de fidelidade de um grupo terapêutico, ele só permanece  e participa se estiver aquecido para aquilo. É muito fácil deixar, sair, abandonar uma sessão de TE. O olho atento do Condutor/Diretor ao ritmo das cenas e na consonância da plateia mantém o aquecimento desejado. A mirada estética produz a sensação de bem feito reforçando, mais uma vez, o aquecimento. E isto é o grande presente dado ao Psicodrama e Sociodrama: ritmo e estética.

segunda-feira, 17 de outubro de 2016

Play. o que é?

A palavra PLAY em inglês tem múltiplas acepções. Brincar, jogar, atuar uma personagem, desempenhar um papel cênico, tocar um instrumento. Em português ficou um pouco reduzido á desempenhar um papel. E isto soa para nós como algo mecânico, artificial. Algo que se aprende com uma finalidade específica. perde-se todas as outras conotações que há em inglês. Atuação carrega, também em português, um peso dado pelo sentido psicanalítico de algo que não é bom, não é sadio, um agir impulsivo disparado pela psicoterapia. também em português, atuação remete à artificialidade, falta de autenticidade. proponho que pensemos Role Playing com a conotação de tocar um instrumento. Pensemos cada papel como um instrumento. Pensemos o Player. Um músico. Olhem um músico. Ele nunca se considera como aposentado confortavelmente no tocar seu instrumento. houve um momento em que realmente ele teve que apreender os rudimentos do instrumento. mas daí em diante ele está sempre voltando e voltando a desafiar-se, aprender novas coisas sobre seu instrumento ou outros instrumentos. Ele reaprende, ele domina e ele CRIA. O musico sente-se estimulado para sair do conforto de um bom desempenho, de um bom tocar.É  Essa espiral do papel: apreender, alcançar o domínio do desempenho e CRIAR. Sempre. Continuamente. O contrário é a cristalização no papel. 

E se?

Moreno, criador do Psicodrama, introduziu conceitos técnicos que , para serem compreendidos tem que ser vivenciados. Sob pena de serem inócuos. Quando traz, dentro da Teoria de Papeis, as palavras Role-Taking (tomada, aprendizado do papel), Role-Playing (desempenho, jogo, atuação do papel) e Role-Creating (criação no papel) elas se tornam ao longo do tempo nisto: palavras, apenas palavras. E passam a ideia que são etapas sucessivas e estáticas. Como passar de ano. Como ser graduado.algo que se obtém e passa ser permanente, incorporado ao indivíduo, cristalizado, enfim. E se pensarmos diferentes? E se imaginarmos isto como um fluxo contínuo, como uma espiral em movimento? E se pensarmos isto como algo que continuamente acontece. Ou pode acontecer. Que sempre, em qualquer papel que desempenhemos, qualquer um, podemos estar sempre retornando à situação de aprendizado, domínio da atuação. Pode ser médico, paciente, cônjuge, pedreiro, artesão. Permitirmo-nos continuamente estar entrando nessas situações. Permitirmo-nos, às vezes, criar alternativas não prescritas de atuação. não permitir que cristalizamos naquela forma em que o papel foi aprendido. Dar uma colher de chá à mudança. 

sábado, 15 de outubro de 2016

personagens, papeis,roteiros

A Teoria dos Papéis  em Moreno ocupa um espaço central. Sua compreensão possibilita ou não a verdadeira apreensão do sentido psicodramático. Para Moreno as interações humanas acontecem entre papéis. Ou seja, em cada relação humana as pessoas estabelecem a comunicação dentro de determinado papel. E papel neste caso tem a mesma conotação de papel cênico. mas quando abordamos isto, sempre aparece alguém para lembrar que a vida é um palco. Não é neste sentido o seu uso por Moreno. Em um papel cênico a personagem tem suas falas, seus maneirismos, seu guarda-roupa, sua história. E em Teatro sempre existe o papel complementar, o contra-papel, o deuteragonista. Mesmo em um monólogo, o outro é pressuposto, já que teatro é conflito. Trazendo essa analogia, quando uma pessoa estabelece relação com outra, o faz dentro de um papel com script delineado. Há papéis  em que o script, o enredo é tão rígido, tão impermeável, que não dá margem a que o ator acrescente sua forma de desempenhá-lo. Outros há em que o roteiro é aberto e fluido. Para um Psicodramista ao se ver uma pessoa há que pensar no seu contra-papel, no seu complementar. Um marido é marido porque há um cônjuge. Aí, quando um dos papeis se ausenta do palco o outro perde sua finalidade. Um só ator não cria seu próprio papel complementar. Ele necessita do outro para que a cena aconteça.

quarta-feira, 12 de outubro de 2016

E assim é.

Experimentar e refletir. 
Este blog é um espaço para mostrar ideias sobre o psicodrama, sobre o teatro espontâneo. 
Há mais de trinta anos uni ao exercício da psiquiatria clínica o exercício do psicodrama. E o psicodrama, mais do que um método psicoterápico, é um modo de ver e viver o mundo. O seu criador Jacob Moreno une os recursos do teatro à ideia do encontro. Encontro como o momento em que a relação entre o membro do grupo/paciente e o diretor de psicodrama/psicoterapeuta torna-se um encontro entre dois seres humanos em papeis diferenciados, mas complementares. O teatro espontâneo, matriz geradora do método psicodramático, se traduz pela criação coletiva de uma história grupal. O teatro espontâneo aplicada à clínica é o psicodrama; aplicado à grupos lidando com papeis sociais é o sociodrama; aplicado à temas éticos é o axiodrama. 
psicodrama e teatro espontâneo.
este é o espaço deles.


Papeis e o outro

No Psicodrama vemos o ser humano não como uma pessoa isolada, mas sempre como um ser-em-relação. Um ser humano se constitui dos múltiplos papeis que ele desempenha na vida. E cada papel que desempenhamos o fazemos em relação a uma pessoa ou objeto. Um papel qualquer só se constroi com o seu contra-papel, seu papel complementar. Só posso ser pai porque há um filho. Só posso ser vendedor se houver um comprador. E aquilo que une, que liga os papeis são os nossos vínculos. uma pessoa em seu papel vincula-se ao seu papel complementar. Isto já está escrito em vários livros. Mas, sentimos realmente que a nossa vida como ser humano necessita do outro, real ou imaginário, em vigília ou sonho? Que quem me constitui como médico é o meu paciente? 

terça-feira, 11 de outubro de 2016

Estudo ou Vivência?

O Psicodrama, o método Socionomico, traz conceitos, termos e visões de mundo muitas vezes radicalmente diferentes das outras abordagens. Iniciar-se no Psicodrama pelo aspecto teórico apenas, frequentemente, redunda em desilusão ou desistência. Na palavra escrita parece ou mágica ou teatrinho ou superficial. Por isto, experienciar diretamente o Psicodrama por meio de vivências grupais prepara o terreno para a apreensão e compreensão da visão teórica trazida por Moreno. As vivências grupais são atos psicodramáticos únicos, não processuais, utilizando a sequência habitual do método: aquecimento, dramatização, compartilhamento/processamento, sendo o processamento a compreensão teórica daquilo que foi vivenciado. Sempre o experimentar do método conduz ao interesse pelo método. Aí sim, o aprofundamento teórico torna-se possível.

segunda-feira, 10 de outubro de 2016

Experimentar e refletir

Experimentar e refletir. O experimentar apenas leva a uma contínua troca de ações, sem aprofunda-las. O refletir tão somente caminha para uma paralisia existencial. Solipsismo. Ensimesmamento. Há que se experimentar, aproveitar o novo, refrescar as conservas. E há que se refletir. Para ir-se fundo. Desdobrar o óbvio. E isto é a base da escolha. A liberdade da experiência junto ponderação da reflexão. Na direção psicodramática/TE toda esta conversa resulta em uma boa direção. O experimentar pode ser a simples expressão do espontaneísmo ou da ansiedade. O refletir somente, inibe a ação. Dirigir, conduzir, em Psicodrama/TE necessita estar aberto ao novo e permitir-se escolher o melhor caminho. Ainda que seja voltar atrás, desfazer o feito. Dirigir em psicodrama/TE é uma espiral em que se passa inúmeras vezes pelo mesmo ponto, em distancias diferentes. Dirigir é escolher. Conduzir o grupo e por ele ser conduzido.

Regras?

Algumas regras que anuncio quando estou fazendo algo de psicodrama e teatro espontâneo:
1- você nunca será obrigado a fazer algo.
2- antes de recusar, experimente.
3 -a qualquer tempo, continuar ou não depende só de você.

TecnArte

Desde cedo quando descobri que, em Grego, a palavra techné é arte, fica flutuando pelo meu espírito uma dúvida que nunca soube muito bem qual era. Sentia que havia algo, mas não estava claro o que. Passei a pensar e refletir.
Os gregos chamavam de techné àquilo feito com habilidade e destreza. Heródoto definia como: saber fazer de forma eficaz. ARS, já para os latinos, conserva a mesma acepção, com outra palavra. Na Idade Média, Ars Mechanica começou a corresponder ao que hoje chamamos de técnica. E aí começa uma divisão entre o técnico e o artístico. Ao primeiro termo é dada uma conotação de precisão e seriedade que parece faltar, no senso comum, ao artístico. Ser técnico é ser preciso, exato, científico. Sério, portanto. Ser artístico é ser sonhador, pouco racional, impreciso. Não sério. Um filho técnico faz o pai confiar no seu futuro. Um filho artista é uma preocupação constante. Entretanto, ao vermos ou lermos a descrição de um matemático da demonstração de um teorema, percebemos que há um sentido estético na apreciação. Uma bailarina é precisa, hábil. Há destreza em seu passo. Os longos anos de preparação de uma bailarina, suas dores, falam de técnica, precisão, exatidão. O exercício é Técnica. E Arte. E como Arte inclui a estética. O gesto preciso e econômico. Como o Artesão. O Artista sabe. E sabe fazer de forma eficaz. O Artista é exato. Chico Buarque diz da saudade: é o revés do parto. Econômico, preciso. Tal como E=mc2. Esta fórmula é bela. Chico é exato. Sempre o bem-feito traduz-se em sensação estética. Podemos estar em sala de psicoterapia, numa prancheta, em um papel escrito, um campo de futebol, uma tela, um barro ou mármore. Tanto a nossa Arte quanto a nossa Técnica confluem-se no bem-feito. Não nos esqueçamos que Poesia, também em Grego, provém do verbo poesis com significado de fazer, fabricar. 

sábado, 8 de outubro de 2016

Teatro Espontâneo (TE), matriz do Psicodrama

E se pensarmos o Teatro Espontâneo não como uma modalidade sociátrica, mas como a matriz do Psicodrama? Podemos pensar o Psicodrama como Teatro Espontâneo aplicado à clínica individual ou grupal; o Sociodrama como TE aplicado a grupos em seus papeis sociais; o Axiodrama como Te aplicado à temas de natureza ética.

quarta-feira, 5 de outubro de 2016

Convite ao Encontro

CONVITE AO ENCONTRO  (JACOB LEVY MORENO)

Mais importante do que a ciência, é o que ela produz,
Uma resposta provoca uma centena de perguntas.

Mais importante do que a poesia, é o que ela produz,
Um poema invoca uma centena de atos heróicos.

Mais importante do que o reconhecimento, é o que ele produz,
Produz dor e culpa.

Mais importante do que a procriação, é a criança,
Mais importante do que a evolução da criação, é a evolução do criador.

Em lugar dos passos imperiais, o imperador.
Em lugar dos passos criativos, o criador.

Um encontro de dois: olhos nos olhos, face a face,
E quando você estiver perto arrancarei seus olhos
E os colocarei no lugar dos meus;
Arrancarei os meus olhos e os colocarei no lugar dos seus;
Então verei você com os seus olhos
E você me verá com os meus olhos.

Então, até a coisa mais comum servirá ao silencio e
Nosso encontro permanecerá a meta sem cadeias.
Um lugar indeterminado, em um tempo indeterminado.
Uma palavra indeterminada para um homem indeterminado.

o proto-agonista

O condutor de psicodrama, o diretor, é o primeiro a pisar o palco. O protagonista inicial. Seu papel é o primeiro a ser desempenhado dentro de um grupo e dele depende o ritmo da condução. A espontaneidade dele é o metrônomo determinante da dança do grupo, não lhe bastando ter conhecimento teórico, conhecimento técnico. É imprescindível que a espontaneidade criativa esteja presente. Permitir-se ser direcionado pelo clima sociométrico e poder escolher o caminho mais sensível.

Postagem em destaque

E assim é.

Experimentar e refletir.  Este blog é um espaço para mostrar ideias sobre o psicodrama, sobre o teatro espontâneo.  Há mais de trinta anos...